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Vitrine de Tendências apresenta “Jardins Botânicos”

Nesta edição, o espaço Vitrine de Tendências destaca os Jardins Botânicos, na sua missão histórica de coletar, estudar, classificar, aclimatar e preservar espécies vegetais e promover a sua transição para o mercado.

Convidamos nossos visitantes a embarcarem em uma pequena viagem pelos Jardins Botânicos através da história, começando pela sua Grande Aventura Botânica.

O Início

Como disciplina científica, a botânica se desenvolveu a partir dos séculos XV e XVI, separando-se gradativamente do herbalismo e da medicina. Tratou-se de um momento importante da história da humanidade, onde vários fatores contribuíram para o avanço da ciência das plantas: a invenção da imprensa, a aparição do papel para a elaboração de herbários e o desenvolvimento dos jardins botânicos, além do florescimento da arte e ciência da navegação marítima que permitiu a realização de expedições botânicas por várias partes do mundo.

A descoberta do Novo Mundo foi um momento revolucionário no conhecimento sobre a Natureza, revestindo-se de grande romantismo, aventuras e do espírito do colecionismo sedento por novidades do além-mar. Como parte deste novo cenário, os chamados Gabinetes de Curiosidades surgiram e experimentaram grande interesse sociocultural, trazendo à Europa objetos, minerais e amostras de seres vivos jamais imaginados, que provocavam emoções intraduzíveis.

Gabinete de Curiosidades – Frontispício do livro “Museu Wormiani História”, mostrando o quarto das maravilhas de Ole Worm (Crédito: Reprodução Wikipédia)

Eles eram também chamados de Quartos das Maravilhas. Além das coleções para mostras e entretenimento e demonstração de posição e status social, os Gabinetes contribuíram grandemente para o avanço das ciências da natureza, favorecendo a mudança das mentalidades. Eles podem ser considerados os ancestrais dos museus modernos. Há evidências de que Gabinetes de Curiosidades também ocorreram no Brasil, por volta dos anos 1630 e 1640 e que continham peças de espécies tropicais da flora e da fauna e eram enviados à Europa para presentear pessoas influentes da sociedade. Os Gabinetes de Curiosidades desapareceram durante os séculos XVIII e XIX, sendo substituídos por instituições oficiais e coleções privadas.

Os jardins

Jardins públicos e privados sempre tiveram fortemente associados ao desenrolar histórico da ciência botânica. As viagens marítimas e a descoberta de novas terras aumentaram a curiosidade e o interesse por plantas promissoras quanto ao seu valor medicinal, alimentício, tintorial e construtivo. Assim, a coleta e aclimatação de espécies desconhecidas tornou-se uma indústria de grande porte e notáveis investimentos.

Os jardins botânicos experimentaram, então, uma valorização imensa em seu papel econômico e cultural. Além das grandes navegações, outro fator impulsionou o conhecimento botânico e o papel dos jardins botânicos foi a publicação da obra Systema Naturae, de Lineu, que classificava os seres vivos e ensejava a ordenação natural, eliminando o caos. Parte desse desenvolvimento tornou-se possível pela criação da chamada Wardian Case, que viabilizava o transporte e sobrevivência de plantas em viagens de longa duração.

Capa do livro Systema Naturae escrito por Lineu e publicado em latim em 1735. (Crédito: Reprodução Wikipédia)

A Wardian Case é considerada ancestral dos modernos terrários e vivários, bem como dos aquários de vidro. Trata-se, em suma, de um recipiente selado para proteger as plantas, que revolucionou a mobilidade e a disseminação de vegetais pelo mundo. Além da sua contribuição econômica, a Wardian Case provocou mudanças socioculturais importantes, tornando-se elementos elegantes e distintivos para as residências e viabilizando grandes movimentos do consumo como a febre das samambaias ou pteridomania, que assolou a Inglaterra entre os anos de 1830 e 1890.

Wardian Cases – Ilustração de Dave Hopkins (Crédito: Reprodução)
Jardim Botânico no Brasil

No Brasil, o primeiro jardim botânico foi fundado em 1798, em Belém, recebendo o nome de Horto Botânico do Pará e tinha como objetivo o cultivo de especiarias orientais. Com o seu sucesso, foram a seguir criados o Jardim Botânico do Rio de Janeiro (1808), Jardim Botânico de Olinda (PE) (1811), o Jardim Botânico de Ouro Preto (MG) e Jardim Botânico de São Paulo (SP), em 1825.

Condizente com o espírito daqueles séculos passados, o valor atribuído às plantas foi quase que exclusivamente centrado em interesses utilitários. Significa dizer que as plantas eram valorizadas pelo seu valor de emprego em funções produtivas para a indústria humana como alimentação, obtenção de fibras, remédios, substâncias estimulantes e outras. As demais eram consideradas genericamente “mato”.

Vai ser necessário muito tempo para que as floras nativas tropicais do Novo Mundo pudessem assumir novos status culturais. No Brasil, esse cenário recebeu a notável contribuição do paisagista e artista plástico Burle Marx (1909 – 1994), motivo pelo qual ele é homenageado neste espaço Vitrine de Tendências. Ele foi o responsável por ter introduzido o paisagismo modernista no Brasil e um dos primeiros paisagistas a utilizar plantas nativas brasileiras em seus projetos. Ele nutriu uma profunda amizade com a ilustradora botânica Margaret Mee, cuja essência foi o amor que ambos nutriam pela flora brasileira e que resultou em largas e importantes parcerias em expedições botânicas.

Heliconia burlemarxii por Margaret Mee
(Crédito: Divulgação – Fundação Botânica Margaret Mee)

No entanto, os ensinamentos desses gênios não se generalizaram e o paisagismo nacional seguiu também o caminho da homogeneização do uso de espécies exóticas e da monotonia, apesar da imensa variabilidade ecológica e da biodiversidade presente.

O uso de espécies nativas no paisagismo e na ornamentação de interiores em substituição, ao menos em parte, das espécies exóticas predominantes no cenário brasileiro é tema importante e recorrente nos debates setoriais ao longo das últimas décadas. No entanto, o assunto é da mais alta complexidade e demanda a análise simultânea de múltiplas variáveis.

Privilegiar o uso plantas ornamentais nativas representa, sem dúvida, opção ecologicamente desejável sob inúmeros aspectos. Porém, a transição da situação atualmente vigente para outra realidade, na qual predomine a exploração econômica sustentável da flora natural demanda uma série de ajustes que precisam ser conduzidos e orquestrados com o envolvimento de toda a cadeia produtiva e sob a ação de agentes públicos e privados sincronizados e afinados com tal objetivo comum.

Por Antonio Hélio Junqueira